sábado, 9 de maio de 2015

Quando a saudade não vem só

Há dois meses vim embora. Outro rumo à vida. Deixei-te junto aos demais. Deixei, pois precisava vir. Eu, com minha vida parcialmente definida, eu sabia onde estava indo. Mas te deixei com tua interrogação sobre onde você gostaria de ir; gostaria de estar. Ao menos foi isso que pensei logo depois que vim. E nos afastamos mais. Não tem haver com afastamento geográfico. Quem dera fosse isso! Chorei uma vez, aos prantos, como agora quando te escrevo. Chorei a primeira vez, depois que me deste uma carona e no carro tocava uma música da banda Engenheiros do Hawaii, que costumávamos tocar juntas: “pra ser sincero não espero de vocês, mais do que educação; beijos sem paixão”. “Educação”: não temos, pois até nosso cumprimento tem sido frio. “Beijos sem paixão”: não há mais toque. Contato físico: abraço, beijo, cafuné, nem mesmo olhares. Nada. Há uma grande barreira entre nós. Tecida por causa de laços terceiros e pelas escolhas que fizemos ao seguir um rumo que nos leva a um horizonte, mas não às amarras de um abraço. Do nosso abraço. Eu estou bem, eu juro! E gostaria de ouvir o mesmo de você. Gostaria de ouvir sobre tua vida; que me contasse uma história. Qualquer coisa. Mas eu penso que não te conheço mais. Ao menos você pensa em mim como eu penso em ti? Ao menos você coloca pra fora estas coisas que gostarias de dizer pra mim, mas que, por algum motivo, guarda pra ti? Ora, eu não sou um monstro! Mas me sinto como um ao teu lado. Lado este que você faz questão de não ficar. Quando eu volto pra aí onde te deixei uma vez, você se afasta. Ausenta-se. E me deixa em um poço de indiferença e dúvidas. Isso só alimenta esse meu vazio. Mas se tu me disseres que este lugar em que escolheste ficar hoje, esse desencontro todo que temos, se me disseres que estás bem, eu ficaria bem também. Eu não pediria pra me explicar nada. Eu só precisaria saber se está feliz, e assim acalmaria meu coração. Mesmo que ainda permanecemos afastadas. Eu acredito que amar é isso: deixar o outro livre. E você pode ir, pra onde quiser ir. Eu só preciso saber se estamos bem. Eu te amo, inabalavelmente, amo, minha irmã.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Alguém de se ver

O que existe na brecha entre o consciente sadio e um inconsciente despindo-se pelo estímulo alcoólico? O que de fato se passa no íntimo e que encontra facilidade para externar-se, sobretudo quando estímulos, como o álcool dito anteriormente, se fazem presentes? Estes desejos ocultos sempre estiveram ali? (Talvez a Psicologia possa explicar isso). Creio que estavam presentes, sim. Bem como alguém que não se vê, camuflado em uma invisibilidade simbólica, criada por quem olha. A diferença é que um desejo é abstrato; alguém é carnal, real, portanto, palpável. Mas este alguém, a que me refiro, esteve em abstrato por algum tempo, admito. Como qualquer outro, era um alguém que produzia existência em corpo vivo bem a minha frente. Presente em certos dias, ainda que alguns deles fossem caóticos no meu íntimo, cujas percepções dos momentos se misturavam entre desejos e realidades. Nem mesmo eu que vivia tais momentos saberia distinguir o que era o quê. Tu não percebias isto, penso eu. Contudo, este alguém, que neste meu período de incoerências e interrogações, também manteve-se em uma suposta invisibilidade, assemelhava-se a algum vício meu. Um vício daqueles que se consistia em qualquer outra coisa (ou outro alguém) comum ao se olhar. Pois, em meu frágil entendimento, quando estamos assombrados por um vício (ou pela cegueira de um gostar), olhar para o outro ocorre, mas sem enxergá-lo. É pragmático. Um simples passar de olhos. Ocorre sem que os olhos identifiquem uma possível existência; um alguém que possa te interessar, te afetar, tocar você. Alguém tão próximo a ti: tuas cores, formas, gestos e intensidades. Tudo que pertence a ela, a este alguém, esteve presente, visível e tocável a minha frente. Escancarado! Mas meu íntimo não permitiu enxergá-la, cego por um vício que, na referida ocasião que manteve este alguém invisível, era soberano, exclusivo e impermeável. Dissolvi, por algum motivo (e em algum momento que não sei dizer precisamente qual foi), todos os mantos que encobriam àqueles que estavam a minha frente. Enxerguei, um a um. Procurei encontrar nos seus corpos os traços que eu não havia enxergado jamais. Enxerguei você. Sob o estímulo alcoólico sei que revelamos nossos desejos mais íntimos. Nos descobrimos. Nos enxergamos. Nossos inconscientes, incomunicáveis em todos os sentidos possíveis, por alguma razão agiram simultaneamente, na medida em que identificaram a brecha perfeita para nos aproximar. Sintonia, química, escrito nas estrelas, ou Deus quis assim. Que seja! Mas desejo que a cada encontro você se revele, despindo-se suas variáveis, sejam elas cores, formas, gestos e intensidades. Que revele o que eu ainda não encontrei em mim. Que eu me encontre em ti, e, principalmente, que permaneça!

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Ao acompanhar alguns debates políticos calorosos pelo facebook, fico refletindo algumas questões que, a meu ver, diferem-se apenas ao contexto a que um posicionamento e outro fazem referência. Por um lado, tem-se defesas de uma política que atenda aos interesses da "nação" em contraposição aos interesses de grupos específicos (diversidades, pois bem). Por outro lado, inversamente, há posicionamentos defendendo os interesses de “grupos específicos” (ressalto: grupos que compõe a mesma "nação"), mas que se debruçam em defesas mais pontuais destes grupos “invisíveis” por compreenderem, em algum momento, estas minorias não são reconhecidas/respeitadas como PESSOAS de direito, como qualquer outra pessoa pertencente à dita nação. Questiono, pois, qual a possibilidade dos problemas de uma "nação" não serem prioridade, como afirmado em alguns discursos, ao priorizarem os problemas específicos de determinados "grupos"? A meu ver, é um pensamento muito vazio, achar que os problemas da “nação” não são priorizados. Estes grupos pertencem à mesma nação, heterogênea! O que está em pauta não é o direito do homossexual (pensando este como um destes “grupos específicos”), por exemplo, em detrimento do direito do heterossexual. Ou o direito da mulher em detrimento do homem. O direito do deficiente físico, em detrimento de uma pessoa sem deficiência. O que está em pauta, indiscutivelmente, é o RESPEITO a qualquer ser humano. Independente de qual seja sua diversidade. Compartilhamos o mesmo espaço, o mesmo mundo, o mesmo ambiente, e se são estes os “problemas da nação”, então defender o direito a VIVER A VIDA, seja do homossexual, do negro, do punk, do morador de rua, de quem quer que seja, é promover a harmonia da convivência neste espaço comum; é promover o respeito; é possibilitar a liberdade de expressar o que se pensa/sente sem que se propague um discurso de ódio que incite a violência; é promover o valor da igualdade, mas com respeito à diversidade. Então estes também são problemas da nação!Tu podes não gostar de homossexuais, negros, índios, ricos, políticos, evangélicos, mas o teu “não gostar” não te da o direito de desrespeitar. De achar-se soberano. Pertencente “a melhor classe”. É necessário que aprendamos conviver juntos, na diferença, pois estamos unidos à mesma terra, ao mesmo ambiente, à mesma nação. Então, um pensamento que atenda a uma nação deve ser policêntrico, que enxergue essa diversidade que nos dá a condição de pluralidade humana. Um pensamento consciente da unidade (é uma única nação) e, concomitantemente, a diversidade (são diferentes grupos). Enquanto não haver essa harmonia é necessário SIM que os interesses de grupos específicos sejam priorizados. Chega de produzir e reproduzir invisibilidades! Basta que a violação dos direitos humanos nos indigne que nos damos conta que fazemos parte dessa luta também