segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Alguém de se ver

O que existe na brecha entre o consciente sadio e um inconsciente despindo-se pelo estímulo alcoólico? O que de fato se passa no íntimo e que encontra facilidade para externar-se, sobretudo quando estímulos, como o álcool dito anteriormente, se fazem presentes? Estes desejos ocultos sempre estiveram ali? (Talvez a Psicologia possa explicar isso). Creio que estavam presentes, sim. Bem como alguém que não se vê, camuflado em uma invisibilidade simbólica, criada por quem olha. A diferença é que um desejo é abstrato; alguém é carnal, real, portanto, palpável. Mas este alguém, a que me refiro, esteve em abstrato por algum tempo, admito. Como qualquer outro, era um alguém que produzia existência em corpo vivo bem a minha frente. Presente em certos dias, ainda que alguns deles fossem caóticos no meu íntimo, cujas percepções dos momentos se misturavam entre desejos e realidades. Nem mesmo eu que vivia tais momentos saberia distinguir o que era o quê. Tu não percebias isto, penso eu. Contudo, este alguém, que neste meu período de incoerências e interrogações, também manteve-se em uma suposta invisibilidade, assemelhava-se a algum vício meu. Um vício daqueles que se consistia em qualquer outra coisa (ou outro alguém) comum ao se olhar. Pois, em meu frágil entendimento, quando estamos assombrados por um vício (ou pela cegueira de um gostar), olhar para o outro ocorre, mas sem enxergá-lo. É pragmático. Um simples passar de olhos. Ocorre sem que os olhos identifiquem uma possível existência; um alguém que possa te interessar, te afetar, tocar você. Alguém tão próximo a ti: tuas cores, formas, gestos e intensidades. Tudo que pertence a ela, a este alguém, esteve presente, visível e tocável a minha frente. Escancarado! Mas meu íntimo não permitiu enxergá-la, cego por um vício que, na referida ocasião que manteve este alguém invisível, era soberano, exclusivo e impermeável. Dissolvi, por algum motivo (e em algum momento que não sei dizer precisamente qual foi), todos os mantos que encobriam àqueles que estavam a minha frente. Enxerguei, um a um. Procurei encontrar nos seus corpos os traços que eu não havia enxergado jamais. Enxerguei você. Sob o estímulo alcoólico sei que revelamos nossos desejos mais íntimos. Nos descobrimos. Nos enxergamos. Nossos inconscientes, incomunicáveis em todos os sentidos possíveis, por alguma razão agiram simultaneamente, na medida em que identificaram a brecha perfeita para nos aproximar. Sintonia, química, escrito nas estrelas, ou Deus quis assim. Que seja! Mas desejo que a cada encontro você se revele, despindo-se suas variáveis, sejam elas cores, formas, gestos e intensidades. Que revele o que eu ainda não encontrei em mim. Que eu me encontre em ti, e, principalmente, que permaneça!

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Ao acompanhar alguns debates políticos calorosos pelo facebook, fico refletindo algumas questões que, a meu ver, diferem-se apenas ao contexto a que um posicionamento e outro fazem referência. Por um lado, tem-se defesas de uma política que atenda aos interesses da "nação" em contraposição aos interesses de grupos específicos (diversidades, pois bem). Por outro lado, inversamente, há posicionamentos defendendo os interesses de “grupos específicos” (ressalto: grupos que compõe a mesma "nação"), mas que se debruçam em defesas mais pontuais destes grupos “invisíveis” por compreenderem, em algum momento, estas minorias não são reconhecidas/respeitadas como PESSOAS de direito, como qualquer outra pessoa pertencente à dita nação. Questiono, pois, qual a possibilidade dos problemas de uma "nação" não serem prioridade, como afirmado em alguns discursos, ao priorizarem os problemas específicos de determinados "grupos"? A meu ver, é um pensamento muito vazio, achar que os problemas da “nação” não são priorizados. Estes grupos pertencem à mesma nação, heterogênea! O que está em pauta não é o direito do homossexual (pensando este como um destes “grupos específicos”), por exemplo, em detrimento do direito do heterossexual. Ou o direito da mulher em detrimento do homem. O direito do deficiente físico, em detrimento de uma pessoa sem deficiência. O que está em pauta, indiscutivelmente, é o RESPEITO a qualquer ser humano. Independente de qual seja sua diversidade. Compartilhamos o mesmo espaço, o mesmo mundo, o mesmo ambiente, e se são estes os “problemas da nação”, então defender o direito a VIVER A VIDA, seja do homossexual, do negro, do punk, do morador de rua, de quem quer que seja, é promover a harmonia da convivência neste espaço comum; é promover o respeito; é possibilitar a liberdade de expressar o que se pensa/sente sem que se propague um discurso de ódio que incite a violência; é promover o valor da igualdade, mas com respeito à diversidade. Então estes também são problemas da nação!Tu podes não gostar de homossexuais, negros, índios, ricos, políticos, evangélicos, mas o teu “não gostar” não te da o direito de desrespeitar. De achar-se soberano. Pertencente “a melhor classe”. É necessário que aprendamos conviver juntos, na diferença, pois estamos unidos à mesma terra, ao mesmo ambiente, à mesma nação. Então, um pensamento que atenda a uma nação deve ser policêntrico, que enxergue essa diversidade que nos dá a condição de pluralidade humana. Um pensamento consciente da unidade (é uma única nação) e, concomitantemente, a diversidade (são diferentes grupos). Enquanto não haver essa harmonia é necessário SIM que os interesses de grupos específicos sejam priorizados. Chega de produzir e reproduzir invisibilidades! Basta que a violação dos direitos humanos nos indigne que nos damos conta que fazemos parte dessa luta também

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Ventar

As vozes delas estavam tornando-se um emaranhado de palavras vazias para minha mente que estava em qualquer outro lugar, menos ali. Não é a presença delas que esta em discussão aqui. E sim uma fuga, que não sei bem do quê era, mas eu a buscava. Ainda que fosse por meus próprios pensamentos. Pus minha mão vidro a fora, com a velocidade alta que eu conduzia o carro e o vento batia firme e frio. Foi quando me senti viva. A cada espasmo na mão. A cada pisada no acelerador que acelerava o carro e impulsionava a força do vento que encostava minhas mãos: o frio, a dor, o invisível, o tato, a percepção do intocável, mas existente. Eu o sentia. A mesma mão que afagava a mão dela, ao lado. Foram as palavras delas que afetou algo em mim. Assim como meu silêncio incomodou a elas. Desloquei seus dizeres a outros contextos, que não àqueles a que estavam sendo ditos. E desvelei coisas em mim, contextos meus, em outros tempos. Cavei na profundeza das minhas memórias o que não eu quis mexer por um tempo. Não consegui resolver, quando deveria. Coisas reservadas, invisíveis e intocáveis, que eu sentia. Assim como o vento. A maior perplexidade dessa história é que eu não sei com exatidão o que é que está havendo comigo. 

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Lembranças

Carpinejar (sempre você), disse: "Infelizmente, a saudade apodrece. Quando deixamos de pedir a presença para cobrar a ausência. É sutil o movimento. Toda a atenção dedicada ao longo de um período começa a ser vista como desperdício. Não aconteceu retorno das juras, nem o estorno das expectativas (...)". É! Todos os dias é um vai e vem. Nem um rosto se repete. Exceto aqueles fieis, que nunca arredaram o pé do seu lado. Não é uma palavra de incentivo que o conforta, apenas. Mas, quem sabe (e eu acredito nisso) o afeto após uma queda tenha muito mais a ver com lealdade. E juras vem de tudo quanto é lado. Questionar sua legitimidade e intencionalidade, pois, também faz parte da vida, que requer um pouquinho de temperança. Mas, como não caminhar recuando, se avançar é lembrar? Ainda não aprendi.

"Quando você chorou eu enxuguei todas as suas lágrimas. Quando você gritou eu lutei contra todos os seus medos. Eu segurei a sua mão por todos esses anos. Mas você ainda tem tudo de mim. Você costumava me cativar pela sua luz ressonante. Agora eu estou limitada pela vida que você deixou para trás. Seu rosto assombra meus únicos sonhos agradáveis. Sua voz expulsou toda a sanidade em mim". Amy Lee.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Reflexão

A leitura da noite "Me ajude a Chorar", Fabrício Carpinejar.
"Somos o que ficamos depois de sofrer. Porque na dor encontramos uma honestidade que não há em nenhum outro sentimento. Porque na dor encontramos uma urgência que não há em nenhum outro lugar. Porque na dor encontramos uma autenticidade que não há em nenhum conselho. Ninguém usará disfarces, adiamentos, mentiras quando sofre. É quando nos conhecemos, nos aceitamos e passamos a amar as pequenas gentilezas e descobertas." Fico refletindo, por várias vezes, sobre essas questões e, confesso que não sei até que ponto é possível a humanidade transcender à dor, a ponto de enxergar na vida seu caráter autopoiético. De se produzir-se e tecer-se enquanto vida. De não necessitar da dor para compreender certas coisas de vida. Toda vida tem sua dor, mas nem toda dor produz vida.

"Se é a negação que se descobre de verdade, o que te sobra além das coisas casuais?"

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Desabafo

Das últimas ironias da vida, cheguei a conclusão que eu não gostaria de cair nas armadilhas do "deveria" ou ficar condicionada ao "se" pelo resto dos meus dias. "Deveria" ter estado mais presente. Ter feito isso, aquilo, ou aquele outro. "Deveria" ter dito que o amava. Que era importante. "Se" assim eu tivesse feito... "Se" eu pudesse voltar e recomeçar... Então, caso houvesse menos “se” e “deverias”, talvez o sofrimento humano não estivesse neste nível: elevado ao extremo. Dilui-se em dor este mal chamado arrependimento crônico. Depois de ir, vai sem volta. Mas confesso o quão difícil é transcender essas barreiras íntimas (em tempo). Penso, às vezes, ser um egoísmo ingênuo, desnecessário, mas que está presente e por isso nos limitamos a dizer e expressar certas coisas. Bom, mas essas questões não são temas de aula, mas aprendizados existenciais. Briga diária consigo mesmo. Ninguém nos ensinou a expressar sentimentos, pois não é algo que se aprende como um B+A=BA. Não existem regras prontas, fórmulas, escritas em um manual que se siga a risca e então, tudo certo. Cada um tem seu ritmo, seus passos, seu jeito, seu espaço, seu modo. Sentir não é suficiente, muitas vezes. Expressá-lo, genuinamente, sim. O modo de expressão, tanto importa. Conteúdo sim

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Rememorando

Utilizar alguns segundos para externar em palavras aquele grito sufocante e que ecoa há dias na cabeça resulta em conclusão. Com ponto final e tudo. Dos dizeres que recito mentalmente, muitos deles estão estampados no meu silêncio. Uma estranhes se fez presente desde que não nos falamos mais e, a meu ver, já não são apenas palavras os meios capazes de desfazer esse abismo com facilidade. É preciso bem mais que isso, se assim o quisermos. Hoje aqui, outra noite que se vai e já declaro que estou bem. Embora tenha pensado muito sobre, consigo fechar os olhos e deixar o azul tomar conta, envolvendo-me nesta calmaria toda que tem sido os últimos dias. (Ou apenas a minha habilidade de relevância tenha aumentado e as coisas estão mais fáceis de lidar). Mas confesso, pois, que desde que decidiu seguir e desprender-se de mim (tudo bem, não havia nó concreto que nos prendesse) tenho sido rodeada por inquietações que circundam o teu ser. Eu penso (e me amedronta dizer isso) que talvez exista em mim uma grande força inconsciente que tenha desenhado este “você” a que me refiro/reflito tanto. Um “você” demandante da minha atenção, do meu jeito cuidadoso, pouco curioso, com um querer embebido da confusão dos dias que tens passado. Mas vendo de outro panorama, não se tratou de manifestações de quereres ocultos ditados pelo meu inconsciente: houve teus dizeres sim, tuas confissões, teus anseios compartilhados e uma possibilidade de sentimento escancarado na timidez das tuas palavras e nos impulsos que as tornavam audíveis para mim. Digo mais: a reciprocidade existiu, convenhamos. O teu querer foi meu querer também. Confessamos isso. Mas por algum motivo (que minha cabeça se revira para responder) você decidiu se afastar. Você se dizia estar em confusão o tempo todo. Não a desfez, eu sei, mas optou se afastar pra não torná-la maior. E fazendo isso, abre mão de algo que te fazia bem (fazia?). Ah, me resta é respeitar, apenas. Enfim, são coisas que jamais serão respondidas. Se pensas em mim, como pensas, se sente falta, se de fato esteve a fim, se terias coragem para seguir, se assim quisesses. Sigo, assim: não podemos parar no tempo, embora ainda me pego reciclando tuas frases. Resgatando teus dizeres. E remoendo eles para buscar entender por que preferiu afastar-se. Como eu disse uma vez: é tão estranho sentir-se estranho para quem se quer bem. Doeu, porque foi importante. Mas se te faz feliz, que prossigas. Sejas feliz!

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Desenhe

Este teu giz colorido já não funciona mais: meus traços permanecem pretos e brancos? Ou tu não me colores mais como queres ou não funciono mais como um quadro receptor para o teu giz. Não quero mais tua cor? Não queres mais a tua cor em mim? Desenha em mim o que quiseres. Cicatriza em minha pele o que desejas ver em mim. Sombreie de preto quando achares que as coisas andam como nuvens negras. Borre quando achares que estava errado e tentou consertar, mas assim como quando amassamos um papel e depois tentamos torná-lo como no princípio, não conseguiremos desfazer os traços deixados, talvez para sempre. Quando as coisas que dizes refletem em um sorriso meu, desenha o que há de mais colorido no maior espaço que conseguires, pois é isso que eu pretendo mostrar a eles: o que há de melhor em mim cultivado por ti (também). Cante aos meus ouvidos, seja a música que for ao tom suave da tua voz, sempre será a melhor das músicas. E desse jeito eu me dôo a você, da forma mais natural, do jeito mais sincero e inocente.

Publicado originalmente em, sábado, 17 de abril de 2010.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Aprendizados tardios

Sem querer desconsiderar outros momentos educativos que permeiam nosso cotidiano... mas é preciso atentar para os aprendizados tardios, no sentido causa-efeito da coisa. Apenas dois exemplos. Ao mesmo tempo em que pode ser curioso abordar isso, também é revoltante, já que, agora está tão óbvio e representa ser mais simples para lidar. O resumo da ópera em um exemplo clichê: é preciso perder algo/alguém fundamental na existência do ser (eu/você), para percebermos o quão valiosos eram. Se bem que isto está intrínseco na condição de ser humano: a consequência mais dolorosa é aquela quando não há o reconhecimento da essência e importância de algo/alguém em tempo hábil para ser feito algo suficiente e que evite, então, perde-lo. Complexo. E aí eu faço um paralelo a outro aprendizado que considero tardio: em consequência da desvalorização do essencial, nosso estado de humor involui para o “down”. Ilustrando: perguntam-te: como estás hoje? E você remoi no seu âmago todas as coisas que poderiam ser responsáveis pela (possível) negatividade do teu dia, mesmo que você encontre como resposta apenas um “levantei cedo hoje, fiquei mal humorado o resto do dia”. Coisas fajutas, convenhamos! Há tanta coisa ruim lá fora. E, ainda assim, o umbigo humano é mais importante que o exterior. Que o outro ser humano, igual a ti. Contudo, só percebemos que estamos (estávamos, melhor dizendo) relativamente bem, quando estamos pra baixo. Tristes, cabisbaixos. Pois, agora, nessa condição de mal estar, de fato temos um motivo palpável para não estarmos e afirmarmos que não estamos bem. Diferente da vez que procuramos algo pra acreditarmos que há algo errado. Sem erro algum. Pra finalizar, reflita sobre. Que espaços você afeta? Como afeta? O que te faz bem? ... Antes de mais nada, é preciso ser feliz (com o que se tem)!